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Ao lado do diretor da OMS, ministra diz que não pretende “vender ilusão” de que imunizante contra de

Nísia: “Vacina não é instrumento mágico”

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, informou que espera a chegada de todas as doses da vacina contra dengue para anunciar o calendário de distribuição aos 521 municípios contemplados, que foram selecionados pelo Ministério de Saúde seguindo critérios como a taxa de incidência da doença e o número de habitantes. Será “calendário parcial”, porque o ministério ainda não recebeu todas as doses contratadas.

“Estamos finalizando esse processo para poder divulgar com segurança (o calendário) e, com isso, respeitar as demandas de cada município”, declarou a ministra. No início da semana, a farmacêutica japonesa Takeda informou que a vacina Qdenga (contra a dengue) terá prioridade no Sistema Único de Saúde (SUS) e terá fornecimento limitado à rede privada. O imunizante teve o registro aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em março do ano passado.

Trindade reiterou que não pode “vender ilusão” de que as vacinas mudarão o cenário de alastramento da dengue pelo país. “Na situação de emergência, a vacina não deve ser vista como um instrumento mágico porque precisa de duas doses, intervalo de três meses, além do que já foi amplamente divulgado, de que, nesse momento, a oferta do laboratório é restrita”, explicou. A ministra mantém contato permanente com a Fiocruz e o Instituto Butantan para que ajudem a agilizar o processo de distribuição para os municípios. O imunizante será aplicado em crianças e jovens entre 10 e 14 anos.

A ministra da Saúde comentou também a possibilidade de ampliar a faixa etária da vacinação contra a dengue. “Está em estudo e, rapidamente, nós vamos ter uma conclusão sobre essa possibilidade de ampliação. Antes disso, vamos começar a vacinar dentro das regras que foram divulgadas”, declarou. Ela ainda acrescentou que, assim que as vacinas começarem a ser aplicadas, serão realizados “estudos observacionais” para verificar o quanto está, de fato, reduzindo a gravidade do quadro epidemiológico e o número de hospitalizações.

Ela voltou a negar a possibilidade de o governo decretar estado de epidemia no país. “Estamos com o Centro de Operações de Emergência (COE) e, neste momento, é a estratégia, do ponto de vista nacional, que consideramos adequada. Temos de ver que, num país com as dimensões do Brasil e suas diferenças socioambientais, neste momento, não faz sentido uma emergência nacional. O que não quer dizer que nós não estejamos em um estado de alerta”, ressalvou.

Neste momento, a mensagem do governo, segundo a ministra, é que a prevenção continua sendo a medida mais importante para frear o avanço da infecção, que já atingiu mais de 392 mil pessoas no país. A orientação mais importante é evitar o acúmulo de água parada em recipientes como calhas, vasos de plantas, tonéis, caixas d’água, entre outros.

Surto global

“Não vamos esperar pela vacina, vamos usar o que já temos. A melhor forma de controlar a doença está nas mãos das pessoas”, ressaltou o diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom. De acordo com ele, o surto de dengue no Brasil precisa do “envolvimento de toda a comunidade” para controlar o vetor da doença, o mosquito Aedes aegypti, que pode estar em “pequenos bolsões de água”. O Ministério da Saúde já alertou que cerca de 75% dos focos da doença estão dentro das casas das pessoas.

Adhamon ainda considerou que o Brasil está “fazendo tudo que pode” para controlar o surto atual. De acordo com ele, o problema é mundial. “Existe um surto global de dengue, a OMS está recebendo relatório de 80 países em todas regiões, com exceção da Europa. Nós achamos que isso tem a ver com a mudança climática também”, declarou o diretor da OMS.

Adhanom pontuou ainda que a vacinação contra a doença é um importante acerto para o país. “O volume da produção precisa aumentar (da vacina da dengue), a quantidade não é suficiente, mas o trabalho que está sendo desenvolvido no momento, acho que a dengue estará sob controle em breve”, disse.

O diretor da OMS reiterou também que o Brasil “tem muita capacidade de produzir vacinas”, como já tinha dito em encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E destacou o papel da Fiocruz e do Instituto Butantan como “inovador”.

Escalada da doença

Pesquisa mostra que taxa de infectados dispara

Um levantamento sobre arboviroses (doenças causadas por vírus transmitidos principalmente por mosquitos), feito pelo Instituto Todos pela Saúde (ITpS), mostra que a taxa de infectados por dengue no Brasil saltou de 0,7% para 13% em menos de dois meses. A análise leva em conta o período entre 19 e 25 de novembro de 2023 e 14 e 20 de janeiro de 2024. Trata-se de um porcentual maior que o registrado no mesmo período de 2022 (8%) e 2023 (6%). A escalada, contudo, tende a continuar. Segundo o ITpS, historicamente, o pico da doença acontece entre abril e maio, o que deve se repetir neste ano. A pesquisa teve como base mais de 50 mil testes de dengue feitos pelos laboratórios Hillab, HLAGyn, Sabin e do Hospital Albert Einstein, entre janeiro de 2022 e janeiro deste ano. O Instituto destaca, no entanto, que a amostragem analisada é baixa em relação à população brasileira e que a maioria dos diagnósticos foi feita nas regiões Centro-Oeste e Sudeste. Além disso, existe a possibilidade de falsos positivos, que podem reduzir a precisão dos diagnósticos. Apesar disso, o aumento registrado pela pesquisa pode ser considerado alarmante, segundo a infectologista Eliana Bicudo, consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). “Os dados corroboram para o fato de que estamos vivendo uma emergência sanitária”, pontua. O Painel de Arboviroses do Ministério da Saúde marcou, ontem, 392,7 mil casos de dengue em todo país, com 54 mortes confirmadas e 273 em investigação. A prefeitura do Rio de Janeiro confirmou, ontem, o primeiro óbito na cidade.

Esforço contra doenças de pessoas vulneráveis

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, e o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, estiveram juntos, ontem, em Brasília, para o lançamento do programa Brasil Saudável. Decreto assinado ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva regulamenta o projeto para eliminar ou reduzir, até 2030, 14 doenças socialmente determinadas, uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.

O programa é voltado às patologias que afetam mais gravemente pessoas em situação de vulnerabilidade social. De acordo com o Ministério da Saúde, entre 2017 e 2021, essas enfermidades foram responsáveis pela morte de mais de 59 mil pessoas no Brasil. A meta é que a maioria dessas doenças seja eliminada como problema de saúde pública: malária, doença de Chagas, tracoma, filariose linfática, esquistossomose, oncocercose, geo-helmintíase, além de infecções de transmissão vertical, como sífilis, hepatite B, HIV e HTLV. Será considerado também o cumprimento das metas da OMS para diagnóstico de tratamento e redução da transmissão de tuberculose, hanseníase, hepatites virais e aids.

Considerados prioritários, 175 municípios brasileiros terão ações integradas. Treze ministérios atuarão em diferentes frentes, como combate à fome e à pobreza; ampliação dos direitos humanos e proteção social para populações e territórios prioritários; qualificação de trabalhadores, movimentos sociais e sociedade civil; incentivo à inovação científica e tecnológica para diagnóstico e tratamento; e ampliação das ações de infraestrutura e de saneamento básico e ambiental.

“Hoje é um dia histórico para nós. Essa ação envolve os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e deve envolver fortemente a sociedade civil”, declarou a ministra da Saúde.

A ministra de Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, representou todos os ministérios envolvidos. “Eliminar tais doenças exige uma política estruturante e sistêmica com ações amplas. Não tenho dúvidas de que, se depender dos nossos profissionais de saúde e dos movimentos sociais, vamos fazer o enfrentamento desse desafio”, ressaltou.

Com a iniciativa, o país estabelece um marco internacional alinhado à OMS, às metas globais estabelecidas pelas Nações Unidas por meio dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030, e à iniciativa da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) para a eliminação de doenças nas Américas.

“O plano pode ser um modelo para muitos países do Sul Global. Para a OMS, é uma oportunidade, porque podemos compartilhar experiências. Nem toda doença pode ser eliminada, porém, as escolhidas aqui podem, sim, ser eliminadas, nós temos as ferramentas para eliminá-las. Dizem respeito aos fatores de risco, estigma, determinação. Essas doenças se alimentam da pobreza e a pobreza as alimentam”, disse Tedros Adhanom. E acrescentou que o programa é para “um país mais saudável, mas também com vistas para um país mais justo”. (MS)

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