Nota de Brasil e Colômbia critica o mandado de detenção expedido pela Justiça venezuelana contra o candidato Edmundo González. E reduz a possibilidade de solução da crise pelo diálogo
Brasil e Colômbia emitem nota de repúdio à prisão de opositor de Maduro
O Ministério das Relações Exteriores (MRE) divulgou, ontem, nota conjunta dos governos do Brasil e da Colômbia criticando o mandado de prisão expedido pela Justiça venezuelana contra Edmundo González Urrutia, candidato de oposição à presidência da nação vizinha. Para os dois países, a determinação do encarceramento é vista "com profunda preocupação" e afirmaram que viola os termos dos Acordos de Barbados, no qual o autocrata Nicolás Maduro se comprometeu a realizar eleições transparentes e com livre participação dos opositores.
"Esta medida judicial afeta gravemente os compromissos assumidos pelo governo venezuelano no âmbito dos Acordos de Barbados, em que governo e oposição reafirmaram seu compromisso com o fortalecimento da democracia e a promoção de uma cultura de tolerância e convivência. Dificulta, ademais, a busca por solução pacífica, com base no diálogo entre as principais forças políticas venezuelanas", observa a nota conjunta.
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva estuda como agir depois da decretação do mandado de prisão, porém vem dando indícios de que a piora da situação na Venezuela dificulta a possibilidade de uma moderação brasileira — e congela as relações os dois países. Mais cedo, em entrevista à agência Reuters, o assessor especial da Presidência da República para assuntos internacionais, Celso Amorim, classificou como "muito preocupante" a ordem de prisão de González.
"Seria uma prisão política e nós não aceitamos prisioneiros políticos. Não há como negar que há uma escalada autoritária na Venezuela. Nós não sentimos abertura para o diálogo. Há reações muito fortes a quaisquer comentários", lamentou.
A decretação da prisão de González representa um novo gesto repressivo do governo de Maduro, declarado reeleito pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) — ambos chefiados por aliados do chavista. As instituições judiciais e eleitorais venezuelanas se recusaram a mostrar as atas eleitorais, como exigiu o Brasil, a fim de demonstrar que a reeleição de Maduro foi legítima e no voto popular.
Descumprimento
Lula, por sua vez, disse que não reconhece a vitória do chavista e nem a de González. A prisão foi decretada depois de o opositor descumprir três convocações do Ministério Público para esclarecer a obtenção e divulgação de atas eleitorais. Ele se recusou a comparecer temendo que já ali sua detenção fosse decretada.
A oposição alega ter acessado mais de 80?s atas eleitorais, que mostrariam vitória de González com 67% dos votos. O candidato foi acusado pela Justiça de desobediência, usurpação de funções, falsificação de documentos públicos e conspiração. O opositor de Maduro está escondido desde 30 de julho, dois dias após a eleição.
A ordem de prisão foi dada no mesmo dia em que os Estados Unidos apreenderam um avião pertencente à Presidência da Venezuela — um Dassault Falcon 900EX, comprado naquele país por US$ 13 milhões. Segundo o governo de Washington, a compra violou sanções impostas ao país sul-americano. A apreensão ocorreu em Santo Domingo, na República Dominicana, que atuou em conjunto com as autoridades dos EUA. O governo brasileiro não se manifestou sobre a apreensão da aeronave, mas é crítico a qualquer sanção ao governo de Caracas.
Uma preocupação do MRE é que o aprofundamento da crise na Venezuela aumente o fluxo de refugiados para o Brasil, que atravessam a fronteira de Roraima. Ontem, o comandante do Exército, general Tomás Paiva, e o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, negaram que haja receio com uma maior corrente de entrada de venezuelanos no país.
"Está tudo dentro da normalidade. O número de pessoas, e temos acompanhado, é o mesmo número de pessoas que têm entrado no Brasil a todo momento", respondeu Múcio, ao ser questionado por jornalistas antes da cerimônia de posse do ministro Mauro Campbell, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).