Jornal Ceilandense
O economista, que optou pela carreira política, nunca abandonou a universidade. Escreveu 10 livros e Trajetória acadêmica respeitada
Monday, 12 Aug 2024 18:00 pm
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Mesmo optando pela car reira política, o econo mista e ex-ministro Antônio Delfim Net to construiu um grande legado acadêmico. Professor emérito da Faculdade de Economia, Ad ministração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), detinha a rara habilidade de transitar entre as várias esco las da ciência econômica.

Lembrado por ironias ferinas e frases memoráveis, ele era de fensor do gasto público como motor de desenvolvimento eco nômico e foi considerado um dos três grandes economistas que moldaram as mudanças da eco nomia brasileira do século 20, ao lado de Roberto Campos e Mario Henrique Simonsen.

Com 10 livros publicados so bre problemas da economia bra sileira, além de centenas de ar tigos e estudos, seus trabalhos didáticos e de pesquisa são vol tados para planejamento gover namental e teoria do desenvolvi mento econômico.

Em sua última ao Correio, em fevereiro de 2014, à época das discussões sobre o início das emendas individuais impositi vas, ele defendeu que não cabia ao Legislativo ter controle so bre o Orçamento. “A perspecti va de acumulação de gastos do

Congresso é uma tragédia, uma patifaria. O risco de derrubada do veto da presidente é o come ço da tempestade perfeita. É de uma irresponsabilidade que não tem limite”, defendeu.

O economista Aloísio Araújo, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Funda ção Getúlio Vargas (FGV-EPGE), manteve conversas informais com Delfim nos últimos anos so bre política econômica. Ele des tacou sua capacidade de se rein ventar. “Inteligente e sagaz, sem pre acompanhou o debate eco nômico tentando se atualizar, na medida do possível”, comentou.

Araújo ponderou que o eco nomista teve erros e acertos, lembrando o legado deixado pe lo “Milagre Econômico”. “A pala vra milagre não muito boa, hou ve economistas, antes, que fize ram reformas que prepararam o terreno para o crescimento eco nômico, não teria sido possível sem isso”, disse Araújo.

A sagacidade era o diferen cial de Delfim, de acordo com o colega. “O mais marcante é que ele via oportunidade para fechar investimentos, colaborou com formação da infraestrutu ra, construção de hidrelétricas, e foi uma fase que permitiu ao Brasil crescer muito. Ao mesmo tempo, naquela época tivemos um crescimento econômico que não se preocupou com educação, fadado a ter certas limitações”, avaliou o economista.

Delfim Netto doou cerca de 100 mil livros para a FEA-USP, onde ele se formou e foi Professor Emérito. Segundo a instituição, sua biblio teca é considerada o mais com pleto acervo da área econômica do Brasil. “O legado acadêmico e intelectual do professor Delfim continuará a ser lembrado por to dos que tiveram o privilégio de conviver com ele, e também por aqueles que poderão acessar as obras do seu acervo construído ao longo de mais de oito décadas disponível na Biblioteca da FEA-USP”, disse a USP, em nota.

Desenvolvimentismo

Ao lamentar a morte de Delfim, o presidente Luiz Inácio Lula da Sil va lembrou a morte da economista portuguesa Maria da Conceição Ta vares, em junho deste ano. “Em um curto espaço de tempo, o Brasil per deu duas referências do debate eco nômico no país”, disse ele.

O desenvolvimentismo entra ponto comum aos dois. Maria da Conceição era progressista, forte defensora da atuação do Estado como impulsionadora do bem-estar social e da promoção eco nômica. Já Delfim Netto se defi nia como um keynesiano, defen sor de uma política industrial pa ra o Brasil e a favor de uma certa intervenção estatal na economia.

“Fica o legado do trabalho e pensamento dos dois, divergen tes, mas ambos de grande inte ligência e erudição, para ser de batido pelas futuras gerações de economistas e homens públicos”, destacou o petista

Frases de Delfim

“A empregada doméstica virou manicure ou foi trabalhar num call center. Agora, ela toma banho com sabonete Dove. A proposta desses ‘gênios’ é fazer com que ela volte a usar sabão de coco aumentando os juros”

“Nunca houve milagre. Milagre é efeito sem causa. É de uma tolice imaginar que o Brasil cresceu durante 32 anos seguidos, começando na verdade em 1950, a 7,5% ao ano, por milagre.”

“O básico é você dar para a sociedade a expectativa, em dados, de que você vai convergir para o equilíbrio fiscal. O equilíbrio fiscal é a mãe de todos os outros equilíbrios.”

“Naquele momento, eu voltaria a assinar o AI-5. Tenho dito isso sempre. Era um processo revolucionário. Vocês têm que ler os jornais daquele momento, saber qual a situação que existia. As pessoas não conhecem a história, ficam julgando o passado, como se fosse o presente. Naquele instante, foi correto.”

“Nós não temos competência para acabar com o Brasil. O Brasil vai sobreviver a todas as bobagens que nós fizermos.” “Nós não temos competência para acabar com o Brasil. O Brasil vai sobreviver a todas as bobagens que nós fizermos.