A investida da Polícia Federal na operação Tempus Veritatis contra Jair Bolsonaro e a cúpula de seu governo, colocou o ex-presidente no centro da investigação de uma tentativa de golpe de Estado. As acusações apontadas no despacho do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, que o citou 71 vezes, mobilizou a defesa de Bolsonaro ao longo do dia de ontem.
Um dos advogados do ex-presidente, Fabio Wajngarten passou o dia rebatendo o conteúdo contra o ex-presidente, apontado como um dos protagonistas e principal beneficiário de atos contra a democracia que, “por meio de um golpe militar”, o manteriam no poder mesmo derrotado nas urnas.
Bolsonaro evitou se expor. À Coluna do Estadão, o ex-presidente afirmou que estava em uma casa de praia, em Angra dos Reis (RJ), mas que não iria pescar porque “estava sem clima”. E que, até a manhã de ontem, não tinha muito conhecimento da investigação. “Não sei o que aconteceu com Braga Netto, Heleno e Paulo Sérgio. Sei que está preso preventivamente o coronel (Marcelo Costa) Câmara, mais um que eu perco aqui, estou sem quatro pessoas ao meu lado”, declarou.
Bolsonaro foi obrigado a entregar o passaporte aos agentes da Polícia Federal e, por determinação de Moraes, não poderá se aproximar dos outros investigados. As primeiras informações referentes à reação de Bolsonaro foram divulgadas por Wajngarten nas redes sociais do advogado.
“Em cumprimento às decisões de hoje, o presidente Jair Bolsonaro entregará o passaporte às autoridades competentes. Já determinou que seu auxiliar direto, que foi alvo da mesma decisão, que se encontrava em Mambucaba, retorne para sua casa em Brasília, atendendo a ordem de não manter contato com os demais investigados”, escreveu o advogado, se referindo a Tércio Arnaud, auxiliar do ex-presidente e que também foi alvo da operação e é investigação na ação. Arnaud é um ex-integrante do “gabinete do ódio”, que atuou no Palácio do Planalto na gestão bolsonarista.
Reforçando a posição de que a apreensão do passaporte foi uma medida desnecessária, o advogado “lembrou” que a única vez que Bolsonaro saiu do Brasil, recentemente, foi para acompanhar a posse do presidente da Argentina, Javier Milei, há 50 dias, após consulta de seus advogados ao STF sobre a necessidade de se ausentar do país. Mais tarde, a defesa do ex-presidente voltou às redes sociais para informar que o passaporte foi entregue à Polícia Federal, em Brasília.
Os advogados do ex-presidente não se manifestaram sobre uma das mais pesadas acusações, a de que Bolsonaro atuou para que o golpe fosse consumado. Ele teria, de acordo com a investigação da PF, conhecimento de uma minuta de decreto que detalhava o andamento das ações contra o Estado Democrático de Direito. O documento teria sido levado a ele por dois auxiliares. Pelo texto, dois ministros do STF — Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes — e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), seriam presos. E o governo convocaria novas eleições. Bolsonaro teria sugerido alterações.
“Posteriormente, foram realizadas alterações a pedido do então presidente, permanecendo a determinação de prisão de Alexandre de Moraes e a realização de novas eleições. Nesse sentido, era relevante para os investigados monitorarem Moraes para executarem a pretendida ordem de prisão, em caso de consumação do golpe de Estado”, aponta o despacho de Moraes.
No início da noite, surgiu a informação de que havia sido encontrado, na sede nacional do PL, em Brasília, um documento com argumentos para a implantação do estado de sítio no país. O texto, encontrado durante a operação de busca e apreensão pelos agentes da PF, propunha medidas que dariam poderes ao presidente para suspender por um mês o funcionamento do Legislativo e do Judiciário.
Wajngarten negou a associação desse documento com Bolsonaro e disse que o conteúdo “não condiz com as tradicionais e reconhecidas falas e frases do presidente”. Ele declarou que a instalação do estado de sítio dependeria de aprovação do Congresso de Segurança Nacional.
“Não tem limite a vontade de tentar trazer o presidente Jair Bolsonaro para um cenário político que ele jamais concordou”, Fabio Wajngarten, advogado de Bolsonaro.
O senador Rogério Marinho (PL-RN) voltou a criticar a atuação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), na condução do inquérito que investiga a uma suposta tentativa de golpe de Estado no país envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados. Para Marinho, a defesa da democracia exige um processo isento, que não estaria acontecendo nas ações sob a responsabilidade de Moraes.
“Não é possível nós assistirmos a uma investigação em que a pretensa vítima presida esse inquérito. Não é possível nós imaginarmos que haja imparcialidade nesse processo. As ações espetaculares que estão se sucedendo mostram que há uma espécie de método, e isso é intolerável porque fragiliza a democracia. A ação do PL é da mesma gravidade, nós estamos falando do maior partido de oposição”, disse Marinho.
Mesmo com o Senado Federal quase vazio, no fim do dia de ontem, um grupo de senadores oposicionistas organizou, de forma improvisada, uma coletiva de imprensa para rebater a
operação da Polícia Federal (PF) que mirou o ex-presidente. Os parlamentares foram questionados pelo Correio sobre a minuta golpista encontrada na sede do PL, mas disseram desconhecer o fato e minimizaram o conteúdo do documento, dizendo que era uma tentativa de “esquentar uma notícia antiga”.
Marinho pontuou que a ação parece uma tentativa de tirar o PL da campanha municipal deste ano. “Querem acabar com o PL”, disse o senador, que questionou como ficará a legenda com o presidente de honra, Jair Bolsonaro, e o presidente de fato, Valdemar Costa Neto, impedidos de falar um com o outro.
Para o ex-vice-presidente de Bolsonaro, senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), o general Augusto Heleno não tem nenhuma relação com as acusações. “Pelo conhecimento que tenho do general Heleno (uma amizade de 50 anos), ele não se envolveria com isso”, disse ele, antes de declarar que as “Forças Armadas não podem se omitir” e devem investigar todas as denúncias que envolvam militares.
O senador Magno Malta (PL-ES) cobrou uma ação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), indicando que espera um processo de impeachment contra ministros do STF. E voltou a levantar suspeitas sobre a lisura das últimas eleições e o comportamento de Alexandre de Moraes. “Eu sei que toda essa narrativa é para chegar em Bolsonaro, esse é o alvo. As narrativas estão sendo montadas para isso. Até o ministro Alexandre de Moraes, que não está acima da lei. Ele é investigado, ele investiga, ele é ofendido, ele é o juiz, ele acusa. Ele precisa se julgar impedido e sair desse processo. Eu apelo para os ministros do Supremo, vocês têm que julgar o impedido, vocês têm que se reunir e tomar uma decisão pelo Brasil”, disse.