» ISABEL DOURADO*
Lançado em 18 de setembro de 1973, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) completa 50 anos e enfrenta vários desafios para recuperar o protagonismo dos anos 1980.
Essa política pública tornou o país pioneiro na incorporação de diversas vacinas e imunobiológicos no calendário do Sistema Único de Saúde (SUS), possibilitando aos brasileiros proteção contra doenças de alta mortalidade. Foi fundamental para a erradicação da varíola e para o controle de doenças como sarampo, rubéola, difteria, coqueluche e poliomielite, por exemplo.
Ao longo desse período, o programa passou por ajustes, adaptações, e melhorias. Especialistas ouvidos pelo Correio reforçam que o PNI se tornou referência mundial, contudo, nos últimos anos, e, especialmente no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), houve tentativas de enfraquecer essa política pública de saúde.
A gestão anterior ficou marcada pela negação da importância da vacinação como um instrumento de proteção da saúde, desinformação e ausência de campanhas publicitárias sobre a necessidade de tomar os imunizantes. Agora, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá vários desafios para recuperar o protagonismo do PNI, que ganhou uma grande repercussão em 1980 com a implementação dos Dias Nacionais de Vacinação como parte da estratégia de erradicar a poliomielite
A doença vitimou milhares de pessoas, de 1950 até 1980, e passou a ser vista como um problema de saúde pública, tornandose uma das mais estudadas durante a primeira metade do século XX. A eliminação da poliomielite demandou uma intensa mobilização de recursos institucionais, tecnológicos e sociais. Com a criação do SUS, em 1988, passou a vigorar uma política de vacinação mais sistemática. O último caso de poliomielite, conhecida como paralisia infantil, foi registrado no Brasil em 1989.
Na avaliação de Ethel Maciel, secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, apesar de já existirem ações voltadas para a imunização desde o início do Século XX no Brasil, o PNI foi fundamental para sistematizar estratégias coordenadas para proteger os brasileiros contra as doenças que assolavam o país na época. “Nós tínhamos iniciativas de vacinação desde a primeira grande campanha, em 1904, quando começamos a lutar contra a varíola. Aconteceram várias ações de vacinação, mas elas eram pontuais e não coordenadas. A criação do Programa Nacional de Imunizações conseguiu congregar todas as ações de vacinação que antes eram isoladas, no primeiro programa, na primeira ideia do que hoje é o nosso PNI. Ainda tínhamos poucas vacinas, se a gente fizer uma comparação com o calendário vacinal de 1973 e o de agora, quando comemoramos os 50 anos do Programa, a diferença é enorme”, ressalta.
Mônica Levi, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), ressalta que, com o estabelecimento do PNI, o Brasil conseguiu controlar e minimizar os surtos das doenças que circulavam com maior frequência no país. “O programa foi fundamental para estruturar as ações de imunização no país e conseguir eliminar doenças, erradicar a varíola, eliminar várias outras doenças como poliomielite e sarampo, embora a gente tenha perdido o certificado de erradicação do sarampo. Mas tétano neonatal, rubéola, síndrome da rubéola congênita, febre amarela e outras doenças no Brasil conseguiu controlar através dessa estruturação do PNI. E conseguiu fazer as ações de uma maneira organizada, coordenada e planejada, porque anteriormente ao PNI, eram ações isoladas.”
Mais de 300 milhões de doses de vacinas, soros e imunoglobulinas são distribuídas anualmente pelo Programa Nacional de Imunizações. Em 1977, foi lançado o primeiro calendário de vacinação com apenas quatro vacinas para prevenir sete enfermidades em crianças de até um ano de idade: a BCG (contra formas graves da tuberculose), a Vacina Oral Poliomielite (VOP), a vacina tríplice bacteriana (DTP — contra difteria, tétano e coqueluche) e a vacina contra o sarampo.
A presidente do Sociedade Brasileira de Imunizações destaca que o aperfeiçoamento do Programa Nacional de Imunizações ao longo dos anos possibilitou o estabelecimento de um calendário de vacinas mais completo do mundo. “O calendário do PNI começou de uma maneira bem mais simples, era apenas para as crianças e começou a ser ampliado, se tornou um dos calendários mais completos do mundo, ofertando gratuitamente para a população e contemplando a vacina para outros grupos e faixas etárias de risco. Para grupos especiais de risco ou vulnerabilidade social, pessoas imunocomprometidas e com outras comorbidades. Então o PNI foi estendendo uma série de vacinas e imunoglobulinas e hoje a gente tem um dos calendários mais completos, ninguém fica de fora”, explica.
Atualmente, o PNI oferece 48 imunobiológicos, entre vacinas, imunoglobulinas e soros, destinados para crianças, adolescentes, adultos e idosos. Há ainda os Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie), voltados para pessoas imunodeprimidas que vivem com doenças crônicas (diabetes, cardiopatia, câncer) e têm um risco maior de contrair infecções ou sofrer complicações por enfermidades imunopreveníveis. Essas pessoas têm o direito de receber algumas vacinas que não são disponibilizadas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS).
Para Ethel Maciel, o êxito do programa em um país de 214 milhões de habitantes reforça a garantia de acesso universal e igualitário à saúde, direito fundamental estabelecido pela Constituição Federal Brasileira de 1988. A secretária de Vigilância em Saúde reforça que o PNI é a política pública mais bemsucedida porque alcança todos os brasileiros de forma efetiva.
“Nosso PNI, ao longo desses 50 anos, foi incorporando e nós temos um sistema hoje muito bem sedimentado, muito bem consolidado de incorporação de novas vacinas. É o maior programa do mundo que oferta vacina gratuita, muitas das vacinas que nós ofertamos aqui são cobradas em outros países. Eu diria que é a política pública mais bem-sucedida que nós temos e aquela que leva efetivamente o direito à saúde, aquela que, eu diria, mais próximo está do texto da nossa Constituição que a saúde é um direito de todos.”